A vilinha
Eva Andrade
Era uma vila pequena, com cinco casas, se não me falta a memória. Eu estava à toa, passando por lá. Quis parar e sentar-me, para sorver o ar refrescante da manhã. Havia crianças brincando, correndo, sorrindo, buscando, na espontaneidade da infância, os momentos absolutos da vida.
Havia uma gata branca, arisca, mas que gostava de interagir. A cada grito da criançada, que se divertia com um esconde-esconde, a gata se eriçava loucamente e subia, usando as suas garras, numa árvore ancestral, cuja copa já sentia o peso do tempo e que, por isso mesmo, secava rente ao céu... A gata fez isso algumas vezes. Um observador arguto sabia que ela queria brincar também. Quando a tensão para descobrirem onde estava uma criança chegava a seu auge, a gata paralisava, aguardando o próximo grito. Tão logo um menino fosse descoberto, o alarido despertava na bichana a vontade de se movimentar e eis que ela repetia loucamente o mesmo ritual: subia, usando suas garras, na árvore ancestral!
De repente, outra cena se insurgiu para a composição da tela. Um casal enamorado se sentou, sob a árvore, para comporem uma canção ao som de um violão afinado. Juntos, cantavam, olhavam-se, mediam-se romanticamente e ali mesmo, despertaram a doce beleza da união. Cantarolavam coisas simples, suaves, boas, cantarolavam o amor. A vilinha, de repente, encheu-se de mais cor. Ao redor deles, orbitavam as traquinagens: as crianças, agora, inventam de atirar umas nas outras gravetos e folhas da mata. E assim as coisas se sucedem, com espontaneidade, dentro de um tempo que nunca passa!
Olho para esse quadro, repetidas vezes. Acima de nós, eis o céu, pronto para nos abraçar! Gritos, cânticos, olhos de vidro se agitando, pernas e braços transitando, em tudo há o que há! Trata-se de uma vilinha singela, cercada pelo intenso verde da floresta, e que desperta sempre com o fluxo do sol! E eu, viajante errante, contra nada protesto, apenas observo e observo esse tempo sem passados...
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Licenciada em Letras e Pedagogia, possui Pós-graduação em Literatura e em Gestão Escolar. Cursou disciplinas do Programa de Mestrado em Estudos Comparados de Literaturas de Língua Portuguesa da USP. Tem livros publicados nos gêneros romance, poesia e infantil. É professora de Língua Portuguesa na Rede SESI de Ensino. O gibi de educação ambiental “Libertar é preciso”, cujo roteiro assina, foi impresso e distribuído para toda a Rede Municipal de Ensino de Pindamonhangaba. Mora na Fazenda Nova Gokula, desde 2006.
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